symbol

16 May 2023

Fisioterapeuta Sara Lourenço: "Estou de volta!"

mask white
Fisioterapeuta Sara Lourenço: "Estou de volta!"

Estou de volta!

Dez meses passaram, desde a última consulta de Fisioterapia que fiz nesta que é a minha casa há 12 anos. Dez meses transformadores que me fazem voltar diferente em muito aspetos,  com a mesma vontade de encontrar os meus utentes, alguns de há muitos anos, para as nossas conversas e partilhas que, muitas vezes, são tão terapêuticas para ambos, como o plano de tratamento em que trabalhamos.

Venho, como desejava, ainda a tempo de me despedir das instalações onde a Physioclem Alcobaça nasceu e cresceu até hoje. A tempo de despedir-me com carinho do meu gabinete destes anos, que guarda muitas partilhas valiosas e uma banda sonora especial -  o som do rio Alcôa - tão agradável durante as conversas, como nos silêncios das sessões mais calmas em que o utente relaxa ou, por vezes, até adormece.

Mudamos em breve para as novas instalações com o entusiasmo e motivação próprios de quem abraça um novo projeto e onde poderemos receber o nosso público, ainda com mais condições e detalhe e por isso sentimo-nos felizes.

Escrevo este texto com uma companhia especial: o meu bebé. Nasceu em dezembro de 2022 e desde então nada mais foi igual. É muito melhor, como também muito mais exigente. Sinto que à parte de tudo o que estudei e continuo a estudar, este foi o período da vida em que mais aprendi, em que mais me superei e em que melhor me conheci. Acredito que por muito que possamos tentar preparar da melhor forma o nascimento de um filho, há uma infinidade de processos que só compreendemos quando os vivemos na primeira pessoa. Por isso, a pergunta que muitas vezes ouvi: “Estás preparada?” não tem muito sentido. Nunca estamos, realmente, preparados. Porém, se estivermos motivados, dedicados, predispostos e disponíveis para abraçar a experiência e vivê-la verdadeiramente, correrá bem de certeza.

O meu bebé tem 5 meses e sinto que a minha gravidez foi há uma vida, tal tem sido a intensidade dos últimos tempos. Desse período em que o sentia, mas ainda não o conhecia, fica a saudade da curiosidade, do imaginário, da expetativa e do secreto encanto de o sentir só meu. Fica também a afinidade e empatia por todas as grávidas. Antes desta experiência, não podemos imaginar todas as transformações, medos, incertezas e ansiedades pelas quais se passa. Fica ainda uma certeza. Não devemos perguntar a uma mulher: “Estás grávida?”. Por muito que se tenha confiança ou intimidade com a pessoa devemos dar-lhe o direito a comunicar quando entende ser o momento certa. Não devemos tentar antecipar esse momento. Por vezes, quem pergunta está mais centrado em si mesmo e em querer provar a sua perspicácia e capacidade de observação do que propriamente em felicitar a gravidez em questão. Este processo é, na maioria das vezes, inconsciente e não intencional. No entanto, é uma pergunta que acredito que não devemos fazer porque se a pessoa ainda não comunicou vamos colocá-la perante uma problemática: mentir, dizendo que não está grávida, ou precipitar um assunto que não estava previsto ser falado para já. Tudo isto tem a ver com o  respeito pelo espaço do outro e esse é um exercício que devemos cultivar.

Durante a minha gravidez, passei por um período menos positivo relacionado com um quadro patológico ao nível da minha articulação da anca direita. A dor física que conhecia de perto através dos relatos dos meus pacientes tornou-se uma realidade presente nos meus dias. Durante dois meses, não consegui andar sem a ajuda de duas canadianas e ainda assim em esforço e com dor. Nessa ocasião, foi difícil compreender e aceitar a razão pela qual numa fase bonita da minha vida, planeada e preparada de forma responsável, tinha de ser “ensombrada” por um problema de saúde que me trazia limitação física. No entanto, este problema também ajudou-me a parar, a descansar, a relativizar outras questões que considerava problemas e que na verdade não eram importantes. Ajudou-me a valorizar coisas simples como poder caminhar na praia ou num passadiço envolto de paisagem verde e fresca; subir escadas de 2 em 2 degraus; pegar o meu bebé ao colo enquanto caminho à beira-mar… e tantas outras atividades simples que tenho a felicidade de poder fazer. Agora, que conheço a frustração de não ser possível, tudo ganha uma dimensão mais valiosa.

A dor física pode assumir um papel muito massacrador e até desesperante se o nosso intelecto não atuar e não mediar bem o processo. A força do psíquico foi determinante na gestão do problema e, embora muitos dias tenham sido difíceis, sinto que me superei.

Hoje, com um diagnóstico de resolução do quadro e com um bebé saudável, não posso sentir-me mais agradecida a Deus e à vida por poder voltar ao trabalho!

Sei que todas estas experiências vão permitir ajudar melhor quem me procura. Sinto que estou ainda mais sensível à dor e à limitação do outro, seja ela que plano for. Sinto que a maternidade nos induz na descoberta de um exercício de descentralização que pode ser muito enriquecedor. Deixa de ser tudo sobre nós, as nossas necessidades, os nossos objetivos, os nossos ritmos e aprendemos a estar mais disponíveis para viver em prol do outro. É assim que regresso. Feliz por poder voltar a ajudar a viver quem comigo partilha a vida.

Até já!

Sara Lourenço

loading