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13 Mar 2013

Dor crónica na Gonartrose

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Dor crónica na Gonartrose

1. Definição

A International Association for the Study of Pain(IASP) define a dor como sendo uma experiência sensorial e emocional desagradável associada à lesão ou potencial lesão tecidular, ou descrita em termos de tal lesão. A dor existe quando e onde o paciente diz que existe. Ambas as definições referem que a dor não existe só quando há alterações em radiografias, ressonância magnética nuclear ou estudos laboratoriais.

A dor é uma experiência que resulta do processamento da informação nociceptiva a nível central. Sabe-se que não há um local específico para o tratamento desta informação, mas sim vários locais que têm diferentes contribuições para a análise e construção de uma resposta adequada, pelo que se diz ser uma experiência multidimensional (sensorial, afetiva e cognitiva). É um sistema dinâmico que pelas suas características torna a dor uma experiência individual, difícil de quantificar e, portanto, difícil de comparar entre diferentes pessoas.

A dor é influenciada por múltiplos fatores como a sua origem (fisiopatologia), a localização, a duração, frequência e intensidade, a personalidade do indivíduo, a sua história anterior (memórias anteriores), o contexto físico, social, familiar e cultural e até pelo apoio de terceiros.

Este fenómeno é indispensável ao nosso organismo pois trás um valioso sinal de alerta em caso de eventual lesão ou doença orgânica. No entanto, quando há dor sem lesão, lesão sem dor ou esta relação é desproporcional levantam-se algumas questões quanto ao seu verdadeiro papel na defesa do corpo. Casos concretos de dor sem lesão ou de relação desproporcional são os de dor crónica, onde muitas vezes não se conhece exatamente a causa da dor, trazendo grandes consequências afetivas e cognitivas pelo seu impacto no dia-a-dia ao longo de muito tempo consecutivo.

No caso da gonartrose, sabe-se bem qual é a razão de tal dor, no entanto pela sua duração e irreversibilidade torna-se crónica e com grande impacto no indivíduo por interferir grandemente com o seu desempenho físico que era habitual. Por isto, pode trazer outros problemas de índole psicológico associados, como a ansiedade, depressão, etc.

A dor crónica é definida como sendo uma experiência que perdura ininterruptamente para além de 3 meses, permanecendo após o tempo esperado para a reparação tecidular. No entanto, não é a duração da dor que distingue a dor aguda da crónica mas, mais importante, é a incapacidade do corpo restaurar as suas funções fisiológicas para níveis homeostáticos normais.

 

2. Mecanismos neurofisiológicos

Vimos que no caso da osteoartrose os fatores que contribuem para a dor são vários. Falámos da sensibilização periférica de carácter inflamatória (Dor Nociceptiva Inflamatória) provocada pela presença de mediadores inflamatórios desencadeado pelas microfraturas sub-condrais, mas também da sensibilização periférica de carácter isquémico (Dor Nociceptiva Isquémica) provocada pela alteração vascular consequente ao excesso de pressão num ponto ou pela tensão muscular mantida onde os fluidos são forçados para fora dos tecidos levando a um meio mais ácido. Também vimos que pode haver dor por excitação mecânica dos nociceptores (Dor Nociceptiva Mecânica) por osteofitos ou compressões derivadas do mau posicionamento articular. Falámos da dor nociceptiva mecânica pelo aumento do volume intra-articular ou até pela alteração da pressão intra-articular provocada por alterações da pressão atmosférica.

Também é possível surgir dor neurogénica periférica na gonartrose. São vários os casos de descrição de tal dor, especialmente relacionada com o nervo safeno (muitas vezes confundido com a tendinite da Pata de Ganso), com o nervo peroneal ou com o nervo tibial. Os axónios são desenhados para funcionarem como autoestradas e transmitir impulsos em vez de os gerar. O processo de geração de impulsos e transdução são papéis das terminações nervosas e, eventualmente, dos gânglios. No entanto, em determinadas situações podem surgir perturbações ao longo do nervo que permitem a geração de impulsos anormais. O conhecimento sobre estes locais de geração de impulsos anormais é a chave para compreender a dor neurogénica periférica.

O mais óbvio é os sintomas derivarem da enervação dos tecidos conectivos do próprio nervo. Quando lesionado, um segmento do nervo periférico pode desenvolver a capacidade de repetidamente gerar os seus próprios impulsos. O axolema está sempre num estado de remodelação. Os canais iónicos estão continuadamente a ser substituídos ou apenas regulados, quer naturalmente quer em resposta a situações da vida. O elemento chave para a descarga anormal tem a ver com a alteração do número de canais iónicos, do seu tipo e da sua excitabilidade. Para além destas modificações, tem de existir um estimulo mecânico e/ou químico que ative os canais, o que é muito fácil acontecer no caso da gonartrose, por todos os fatores já vistos.

Com o aumento do input nociceptivo para o SNC, pela ativação dos nociceptores, pela sensibilização dos nociceptores silenciosos ou mecanicamente insensíveis (uma vez ativados, os nociceptores silenciosos passam a ter limiares de excitação baixos, excitação espontânea e frequências de descarga aumentadas face ao estimulo) e pela conversão do fenótipo de aferentes não nociceptivos, surge a Hiperalgesia primária e Alodínea.
Este enorme conjunto de fenómenos quando mantidos no tempo podem desencadear um outro processo de excitação, a sensibilização central. É característica da dor crónica, especialmente nos casos onde a informação nociceptiva periférica não coincide com a intensidade da dor, acontecer a dor de origem central. Concretamente na osteoartrose do joelho vários autores defendem a existência de um processo de dor central.

Os altos níveis de excitabilidade e de neurotransmissores leva a uma destruição dos interneurónios inibitórios. Perante estímulos de alta intensidade e frequência, o potencial de membrana dos neurónios de projeção atingem níveis que forçam a remoção do magnésio dos canais iónicos NMDA e assim permite a entrada de cálcio para a célula, ativando processos de feedback retrógrado. Este processo conduz a uma destruição do sistema de modulação da dor e, portanto, facilita a dor sem lesão periférica.

Para além da maior excitação pós-sinaptica, outro efeito do aumento da concentração do cálcio intracelular é o aumento de produção de óxido nítrico que tem importantes funções de segundo mensageiro dentro da célula e pensa-se que é capaz de se difundir para fora da célula para aumentar a ativação do neurónio periférico aferente.

Há ainda uma reorganização anatómica ao nível central (nos cornos posteriores da medula), aspeto importante na sensibilização central. Mecanoreceptores que normalmente faziam sinapse nas lâminas III e IV passam a ligar-se à lâmina II, excitando neurónios centrais que transportam a informação nociva. Desta forma, estímulos mecânicos centrais podem tornar-se em estímulos dolorosos – Alodinea de origem central.

O aumento da atividade sináptica resultante de um estado de sensibilização central pode influenciar a atividade noutros polos neurais, podendo desencadear e assim explicar alterações na função motora e autónoma, que estão presentes em muitos estados de dor – Facilitação Medular ou Segmento Facilitado.

Esta disfunção somatomotora e química mantém-se num ciclo vicioso de dor, onde outros fatores como a personalidade, estado psicológico e outros fatores externos têm um papel muito importante. 

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Fig. 1 – Caminho da dor - Esquema representativodas possíveis reacções da pessoa em situação de dor / dor crónica.

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